segunda-feira, 21 de abril de 2014

"Perdida para sempre; não era capaz de entender, e tentava suportar o sofrimento desta contradição: por um lado, uma existência, uma ternura, em mim sobrevivendo tais como as conhecera, isto é, criadas para mim, um amor em que tudo de tal maneira encontrava em mim o seu complemento, o seu objectivo, a sua constante direcção, que o génio de grandes homens, todos os génios que houvessem existido desde o começo do mundo não valeriam para a minha avó um só dos meus defeitos; e, por outro lado, mal tinha revivido como presente essa felicidade, senti-la atravessada pela certeza, arremessada como uma dor física repetitiva, de uma nada que apagara a minha imagem dessa ternura, que destruíra essa existência, que abolira retrospectivamente a nossa mútua predestinação, que fizera da minha avó, no momento em que a reencontrava como num espelho, uma simples estranha que um acaso fizera passar alguns anos ao meu lado, como poderia ter acontecido com qualquer outro, mas para quem, antes e depois, eu não era nada, eu não seria nada."
- Em Busca do Tempo Perdido, vol. 4 - Sodoma e Gomorra
Marcel Proust

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