sábado, 2 de abril de 2011

"E tivesse eu a eloquência nas palavras para dizer o quanto doi. Expressar em quatro ou cinco linhas o quão assustadora a perspectiva do futuro se assemelha ou em três ou quatro palavras o receio do que se adivinha. 
Falta o dom para as palavras, desenhar com o alfabeto o retrato do que agora sinto e fervilha por dentro. A partir do pulsar mecânico do coração alinhado com as sinapses e actividade química do cérebro, o rei sem trono deste reino que aprisiona a alma, a consciência do fim. Um lugar comum. 
A vida é um lugar comum. Nós é que gostamos de inventar, criar problemas e num pensamento paranóico e egoísta termos a certeza que somos diferentes, especiais, nada se compara aos nossos pequenos grandes problemas irreflectidamente hiperbolizados pela condição humana. Convencemos-nos que somos especiais, mas apenas fazemos parte de um lugar-comum em que vivemos aprisionados. 
Assim, a vida é mais fácil de aguentar, se pensarmos que de facto existe um sentido para isto tudo, um propósito quando não, na verdade não há um plano pré-definido e temos todos a mesma vida, vivemos todos neste rudeza de lugares comuns a que chamamos existência. 
Se fizesse sentido, o fim não era este. Se o universo fosse justo não estava à sua cabeceira neste quarto de hospital. 
A vida não passa de um lugar comum, que corre invariavelmente para o mesmo fim e aí descemos ao que realmente sempre fomos, descemos à elementar condição humana da qual teimosamente ansiamos escapar. No fim, é tudo o mesmo, voltamos à terra e elevamo-nos ao universo e regressamos ao cosmos, à ordem do alinhamento das estrelas. O pó.
Tomara eu ser dotada da eloquência necessária de dizer isto e fazer perceber o quanto doi. Mata. Destroi. Porque mesmo conscientes de que nada eterno, a iminência do fim continua a ser o abismo que nos olha persistente e desafia o passo em frente. E não há como voltar atrás. 
Não há nada de digno na morte, apenas coragem."
- 10 de Março, 2011

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