A minha tartaruga decidiu falecer e eu estou muito abalada com esta decisão. Chamava-se Tati - eu sou terrível a dar nomes a animais de estimação, tive um
hamster chamado Kiko - por causa da
Tati do New Wave, eu gostava muito da moça e também gostava muito do New Wave e achei que eram um bom nome para ela.
Eu tinha seis anos, mais coisa menos coisa, quando a antiga minha vizinha do lado me ofereceu a criatura, assim adorável, pequenina, cabia na palma da minha mão.
Foram muitos anos de amizade e respeito mútuo: eu deitava-lhe os camarões secos e ela ia comer, parecendo-me muito alegre e contente por este acto de proximidade e afecto. Eu passava por ela na cozinha, deitava-lhe o olho para ver se ela estava bem e ela de vez em quando até olhava, acho que para ver se eu tinha mais camarões. Era por interesse no fundo, mas eu percebo, compreendo a necessidade da pequena se alimentar. Mas era uma relação sincera e eu gostava mesmo dela, portanto quando a minha mãe por telefone me avisou eu fiquei muito abalada.
Há tempos atrás apanhei um susto: estava na terra e fui ver como ela estava, se se estava a adaptar ao novo ambiente, mas a moça não se mexia. Eram quatro da manhã e eu comecei a chorar histericamente porque pensei que ela estava morta e então acordei os meus pais e tudo, histericamente, com lágrimas a cair pela cara (às quatro da manhã). Afinal, a pequena estava só a hibernar. Fazia sentido, acho que ainda estava frio e não era bem Primavera ainda. Mas eu fiquei muito triste com a ideia dela morrer. São muitos anos de convivência.
Vou ter saudades. Os meus pais costumam brincar comigo e dizer que um dia a levavam para o Jardim Zoológico, para aquele lago onde estavam outras tartarugas, e eu ficava muito chateada.
Vou ter saudades de passar por ela para ir ao frigorífico, beber água gelada e olhar para ver se ela se está a mexer. Ou enfiada debaixo daquela pontezinha com a palmeira. Ela tinha muito o hábito de se enfiar lá de baixo, não sei porquê era feliz assim. De vez em quando também se virava de costas e ficava a esbracejar com as patitas e eu tinha de a ir virar. Outra vez fugiu da casinha, que já estava a ficar demasiado pequena, e encontra-mo-la debaixo do fogão. Pensando nisso, ela tinha muito o hábito de se enfiar debaixo das coisas.
É um pouco a minha infância que ali está. É um pouco parte da minha infância que se vai também. E isso é um tanto assustador.
Adeus, Tati. Foste sempre uma boa tartaruga para a menina de seis anos que ainda permanece em mim. Vou, de facto, ter saudades tuas.